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sexta-feira, 1 de outubro de 2010

O Minotauro

Muitas vezes as pessoas levam anos ou mesmo uma vida toda evitando o enfrentamento de seu próprio mundo interno, fogem de si mesmas, ignoram ao máximo o que há nelas, criam diversas estratégias para se manterem “longe” de si mesmas, ou como diria a psicanálise de Freud, desenvolvem inúmeros mecanismos de defesa para supostamente se protegerem. Mas essa proteção é ilusória e ineficaz.
Grande parte das psicopatologias advêm da dificuldade das pessoas conhecerem a si mesmas, de compreenderem como funciona a própria emoção. Assim, quanto mais evito um problema, mais tempo o problema persiste e evolui. Para vencer é preciso fitar face a face nossos próprios monstros.
 Como disse Nietzsche: “o homem precisa daquilo que em si há de pior se pretende alcançar o que nele existe de melhor”.
Os mitos são metáforas imagéticas que traduzem os acontecimentos psíquicos do mundo do inconsciente, e às vezes até mesmo conscientes.
Muitas pessoas relacionam mito com fantasia ou a algo que não corresponde à realidade porque pensam neles como algo literal que um dia aconteceu, mas o mito é muito mais do que isso e talvez tenha até acontecido, porém no âmbito do simbólico, tão real quanto à realidade propriamente dita.
Só para ilustrar conto aqui uma pequena passagem do mito do Labirinto e do Minotauro.
O engenhoso Dédalo a pedido do rei Minos, construiu um labirinto gigantesco para lá aprisionar e manter o terrível monstro Minotauro, uma vez que essa criatura aterrorizava o povo de Creta. E até certo ponto o labirinto mantinha o monstro metade touro metade homem distante dos homens, porém às vezes, alguém tinha que passar pelo labirinto e se encontrar com o Minotauro, e aqueles que mais o evitavam e o temiam eram também os que sucumbiam à fera. Até alguém se preparar e decidir enfrentar o monstro, Minotauro havia destruído inúmeras vidas.
Quantas vezes não somos tão engenhosos tanto quanto Dédalo? Quantos labirintos psíquicos construímos, e lá mantemos nossos piores inimigos, existindo em nós, coabitando num mesmo espaço que o nosso?

terça-feira, 23 de março de 2010

Isabella Nardoni - Afinal, estamos evoluindo ou regredindo?


Casos como o de Isabella Nardoni e do menino Pedro Henrique Marques Rodrigues, comovem o grande público por vários motivos.

Um dos motivos é a explicação mais óbvia, ou seja, a de que se trata de crimes hediondos com requinte de crueldade e perversidade. Mas afinal, por que isso nos incomoda?

O caso de Isabela Nardoni é o mais famoso, porém não é o único. No caso do menino Pedro de Ribeirão Preto, vemos uma história trágica muito parecida com a de Isabela.

O menino Pedro de apenas 5 anos morreu, segundo os pais por ter ingerido um produto químico, já de acordo com o laudo do Instituto Médico Legal (IML) de uma embolia pulmonar gordurosa provocada por fratura. O menino teria sofrido maus tratos pelos pais antes de morrer.

Nesta semana fui procurado por uma emissora de televisão de Ribeirão Preto e região para tentar explicar porque as pessoas se comovem tanto com casos como os de Isabella e do menino Pedro.

É um fenômeno comum da espécie humana se identificar com a vítima em potencial. Chamo de vítima em potencial aquele sujeito indefeso, frágil ou fragilizado, ingênuo, desprovido de força e preparo o bastante para se proteger contra o agressor. É o caso de uma criança em relação a um adulto agressor.

Nos filmes, nas novelas, nos romances, torcemos pela vítima porque nos identificamos com ela, nos imaginamos em seu lugar, ainda que de forma não tão consciente (talvez por isso funcione tão bem).

Essa empatia de que falamos, infelizmente não se apresenta no agressor perverso, naqueles sujeitos maiores e providos de maior força que uma criança, neles não há esses movimento de se imaginar no lugar da vítima.

Esse tipo de coisa nos incomoda porque conseguimos nos colocar no lugar da vítima, imaginariamente, claro. A vítima em potencial tem essa capacidade de evocar, em sujeitos mentalmente saudáveis, a empatia, isto é, a capacidade se imaginar no lugar do outro.

Já as razões para a motivação de crimes como esses, podem ser várias, porem basicamente podemos citar alguns motivos preliminares:

a) A inversão de valores, onde o que vale é o individualismo e a satisfação do “si mesmo” em detrimento do outro e da coletividade,

b) O movimento contrário à empatia, portanto uma antipatia,

c) A valorização das coisas exteriores a si mesmo, como o parecer ser algo e não o ser de fato.

Em casos de infanticídios por adultos também podemos pensar no fenômeno do bode expiatório, no qual todas as sensações negativas do agressor são transferidas para uma vítima sacrificial, uma vítima em potencial.

De acordo com o livro “A Violência e o Sagrado” do antropólogo francês René Girard, a idéia da vítima sacrificial (em casos como o de Isabela Nardoni e do menino Pedro) faz muito sentido. Então o agressor transferiria seus “pecados” à vítima, ou seja, tudo aquilo que ele julgar como negativo é transferido ao bode expiatório, à vítima sacrificial. A "culpa" sai de seu portador original e se transfere para a vítima em potencial, indefesa e impotente diante do agressor.

Houve tempos e lugares onde o sacrifício humano era praticado como forma de expiação, porém em sociedades mais primitivas. Contudo, para essas culturas havia um sentido, o que não quer dizer que seja algo aceitável, alias em nossa sociedade e cultura é absolutamente inaceitável.


Mas então, qual é o sentido?

Pois é, não cabe em nossa sociedade e cultura um sentido que justifique tamanha crueldade.





Diego Gutierrez Rodriguez
CRP: 06/75564

sexta-feira, 5 de março de 2010

O Inevitável Encontro

O que aconteceria se você ficasse só? Isolado de tudo e de todos, sem contato nenhum com o mundo de fora. Como seria você convivendo com você mesmo?

Imagine que você tenha se isolado em uma ilha, onde não há nenhum outro, só há você e o ambiente.

Para algumas pessoas se torna uma tortura ficar quieto e só, sem ter o que fazer, sem ter pra onde ir. Por quê?

Quando estamos sós os fantasmas aparecem, somos obrigados a nos confrontar, a enfrentar nosso mundo interno. Enquanto estamos fazendo coisas, fazendo barulho, não ouvimos o que temos a dizer a nós mesmos, enfim, não sabemos o que se passa nos bastidores, o que há além das cortinas.

Muitas vezes vamos evitando de maneira maníaca um encontro com nós mesmos, mas um dia inevitavelmente esse encontro será promovido pelas circunstancias da vida.

Um dia desses reencontrei um grande amigo que fazia muito tempo não o via. Ele sempre foi alguém muito ativo, até pra falar ficava agitado, se mexendo, andando de um lado pro outro.
Suas palestras arrebatavam todos da platéia. É um cara cheio de alegria e energia. Se você fosse um espectador de uma de suas palestras, certamente seus olhos correriam de um lado ao outro tentando acompanhá-lo. Uma hora, duas ou mais, passava num instante, nunca foi um sujeito entediante.

Começou a trabalhar cedo, o cara era um vulcão em erupção, não conseguia ficar quieto. Seu trabalho mais vocacional (para o qual foi chamado das profundezas de seu inconsciente) tinha fator de periculosidade o que o forçou a aposentar-se muito jovem.

Esse amigo, pensou que com o tempo que teria vago, se dedicaria a família e a outros afazeres, porém havia tempo de mais para preencher.

Aconteceu que ele sucumbiu ao labirinto escuro da depressão, do transtorno de ansiedade generalizada e da insegurança. Ele havia se encontrado consigo mesmo, ou melhor, com suas neuroses e psicoses. Ele se perdera, mas, como dizem, ás vezes é preciso se perder para se encontrar.

Tudo o que ele mais temia de dentro de si mesmo e havia passado grande parte de sua vida evitando, agora fora obrigado a confrontar. O inevitável encontro com seu lado obscuro e doente tinha acontecido.

Toda aquela superfície de energia, de aparente autoconfiança e de alegria tinha caído. Era preciso trocar de pele ou viver doente.

O reencontrei já recuperado, de fato ele tinha se encontrado, agora era alguém que não vivia em fragmentos, estava completo, mais sábio, sabia e admitia toda sua fragilidade e obscuridade.

A final, ele tinha entendido que a escuridão e a luz se complementavam.

Diego Gutierrez Rodriguez
CRP: 06/75564